sábado

Cotidiano


- Alô?
- Alô! Boa tarde! Gostaria de falar com a senhora Odete da Silva Barbosa. Ela se encontra?
- Depende.
- Depende de quê?
- Depende de quem a procura.
- Quem procura obviamente sou eu.
- E você é mais alguma coisa além de um “eu”?
- Sou a oportunidade que a senhora esperava pra mudar de vida. A senhora estaria interessada?
- Hum. Muito me interessa mudar de vida. Você pode me oferecer isso?
- Isso e muito, muito, muito mais.
- Olha que assim que fico sem jeito.
- Sem jeito por que?
- Um sujeito que liga assim para a casa dos outros, e vem com essa conversinha com uma mulher desconhecida...
- Mas a senhora não é desconhecida. Pelo contrário. Sei de exatamente cada detalhe da sua vida.
- Jura?
- Absolutamente. Sei coisas que deixariam qualquer um de queixo caído.
- Ora, assim começo a ficar sem jeito. O que saberia o senhor sobre mim que deixaria os outros abismados?
- Coisas sujas!
- Não diga!
- Coisas pérfidas!
- Mentira!
- Coisas absurdas!
- Oxente! Conte de uma vez, criatura!
- Pra quê apressar as coisas? Antes me deixe informá-la das opções de negócios que poderemos efetuar juntos.
- Ora, mas eu não disse que topo.
- Topas?
- Topo!
- Preciso apenas fazer uma pergunta para efetuar nosso negócio! Preparada?
- Ahhh, não sei.
- Coisa rápida.
- Ah, ta bom.
- Eu quero saber... sua data de nascimento!!
- Ah é isso? E pra quê?
- Quero saber se a senhora tem o perfil do nosso negócio.
- Hum. Sei. Meu aniversário é 18 de março de 1978.
- Ok.
- E então?
- Então dona Odete. Infelizmente não poderemos concluir nosso negócio.
- Ué, por que?
- Por que consta no nosso sistema que a senhora não anda em dia com suas responsabilidades financeiras!
- Como assim, gente?
- A senhora não esteve ciente de suas obrigações!
- Continuo boiando!
- A senhora está suja na praça!
- Na praça? Como se eu to na cozinha de casa?
- Quero dizer que a senhora está com o nome sujo no Serviço de Proteção ao Crédito, vulgo SPC. E que não poderá comprar nem um quilo de sal na mercearia se não tiver dinheiro em mãos. Tudo isso por negligenciar contas atrasadas. Sabe como chamamos isso?
- Engano?
- Não! Trambique!
- Eu não sou trambiqueira!
- Não é o que diz seu histórico de devedora, dona Odete!
- Pois que seja, mas não tenho como pagar.
- Eu tenho uma sugestão!
- Diga!
- A senhora me presta um servicinho e aí ficamos quites.
- Que tipo de servicinho?
- Quer mesmo que eu responda?
- Acho melhor não.
- Eu também acho. Aliás, prefiro mostrar. Jantar hoje a noite?
- Na minha casa ou na sua?
- Na nossa! Meu amor! Te amo pururuquinha!
- Pururuquinha? Pôxa Oswaldir! Assim você acaba com toda a fantasia do negócio! Broxei.
- Mas também heim mulher, tanto tipo de gente pra tu ter fetiche e tu vai se interessar justo por um telemarketing! É dose.


                                                                                                                                 FIM

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